A inovação e abrangência do mundo contemporâneo fez emergir a ideia de que nenhum sistema de segregação e opressão cultural ou social poderia voltar a determinar para sociedade as diversas proibições e prisões sociais do ter e do ser que, por diversos períodos, a humanidade enfrentou. A esperança de viver em uma realidade de discursos abertos, de independência, onde se faz e pensa o que se quer, apresentou-se como luz aos homens modernos que acreditavam que nenhuma espécie de valor majoritário dominaria a sociedade. Um mundo que, teoricamente, seria livre para acionar qualquer desejo e realizá-lo sem impertinências alheias. Mas apesar de todos os frutos libertadores que a contemporaneidade propiciou (resultado de lutas passadas e de transformação social) os seres humanos ainda são subjugados e, pior, não percebem e, se percebem, preferem não depor contra esse sistema de formação de alienados. Os cidadãos afirmam serem livres e independentes, mas toda a sua força de trabalho é aplicada para produzir seu capital, que comumente é voltado para se impor no coletivo. Vence quem mais tem. A moda é o principal exemplo disso. A função de vestir-se é social e segundo os valores que criamos, moral. A ausência de roupas, na ideia de nossa razão, torna o indivíduo imoral e vulgar, senão um louco que não é mais dono de si. Há exceções. Os índios, não se vestem, mais como desde os tempos mais remotos fora assim, a sociedade os define como unidades culturais, em que a rica cultura dos "primitivos" brasileiros deve ser considerada resultante de um comportamento cultural. Mas a moda, fora dessa realidade bonita e amoral de tribos e aldeias, surpreendentemente subjuga o homem e o faz sentir-se inferior ou superior de acordo com o que veste. Intrigantemente, na dita era da liberdade, somos ainda presos por conceitos impostos pela classe alta (uma minoria em relação a grande massa), sobre o que é bom ou ruim. Vestir roupas de grife e alta costura valora o homem de uma simples inferioridade social para alguém que deve ser respeitado, enaltecido e comentado no seu meio social. Consequentemente, o homem, que acha que vive plena liberdade, aplica toda a sua força de trabalho arduamente para reverter toda sua renda para conquistas materiais que proporcionam prazer mais para o coletivo do que para si, já que consome o que o outro define como qualidade para que possa ter status e as mais variáveis designações materiais.
Os seres humanos atualmente não são subjugados apenas por líderes e por uma política centralizadora. São subjugados, em absoluto, por seu complexo de inferioridade social e material. Nesse sentido, as roupas, aparelhos e produtos diversos tornam-se mais relevantes que a natureza humana, o ser humano. O valor de ser ser humano está se tornando gradativamente menor do que o valor de ter produtos humanos. O acúmulo define o valor humano e toda matéria cria novos padrões sociais de comportamento e aceitação social. Dessa forma, as pessoas tem sido tratadas sem qualquer valor humano quando não possuem uma estrutura material; perdem seu valor humano por não conhecerem estilistas, não terem capital para comprar uma indumentária de alta grife ou não realizarem todas as atividades da "classe alta". Nesse sentido, a pobreza e a falta de matéria são tratadas como uma anomalia social e defeito pessoal. A televisão explora a imagem do pobre, o ridiculariza como uma vergonha social. Na tv, qualquer programa humor usa como temática principal a "falta de noção do pobre de se vestir". Suas roupas são demonstradas como indevidas e espalhafatosas, mostrando o exemplo da ridicularidade de quem não sabe o que é marca, grifes... As piadas surgem associadas com o comportamento do pobre, o descuido físico proveniente da falta de dinheiro e os espectadores divertem-se com a inferiorização do outro. Na era da discussão e estudo sobre o "Bullying" nas escolas, o adulto pratica com sua faixa etária definindo com um belo momento de lazer. Não consideram o fato de que essas pessoas sofrem por serem considerados (pelo ignorante valores sociais) como "feios", "magrelos", "gordos", "sem cultura", "burros" e "banguelos"... É o produto que está valendo mais que seu autor: os homens.
O comtemporâneo trouxe a liberdade de escolha, de vida, mas os humanos ainda seguem as leis e as regras dos que definem que o importante é ter e acumular. Ocorre que atualmente a matéria, roupas e produtos diversos tem mais função do que facilitar a vida social. Ela criou seus próprios valores. Depois de tantas subjugações desumanas e incongruentes, vivemos na "Era das Ignoranças", em que as coisas tem mais valor que a vida e se os cidadãos não compram tais coisas ou não as podem ter, são condenadas ao massacre e mediocridade do status sociais, tratando gente como máquinas e agrupando o que é ser rico, pobre, da moda, da confecção e do que pode ser respeitado e do que pode ser inferiorizado. É a humanidade segregada não por um, mas pela coletiva pobreza racional dos seres humanos sempre querendo superar o outro, o mundo e determinando um padrão social baseado no valor (excedente) do homem de posses materiais e do valor (pequeno) do homem sem posses materiais. É a nova sociedade formada de homens que valorizam tanto a matéria, que tornaram-se produtos dela, verdadeiros humanos produtos.