segunda-feira, 13 de setembro de 2010

O Chinelo de Chinelo.



Era verão e o sol estava queimando, Chinelo, um menino magro como uma vara e esperto mais do que muita gente grande, andava nas ruas procurando qualquer ocupação e esperando uma comida "aparecer". Pela manhã já havia percorrido todo o comércio, mas a "tia" não tinha jogado comida fora ainda, então, o jeito era pedir ou esperar o vacilo de alguém "É, isso que vou fazer". No caminho encontrou Gorila e Raimundo, os meninos que tinham fugido da "Casa de Abrigo". Lá tinha cama, comida, mas não gostavam das ordens e nem das surras que levavam. Eles sempre diziam "Lá tem gente ruim, Chinelo, bom mesmo é a liberdade da rua. Se seu pai não te quis, você não tem que ser de ninguém". Chinelo pensava nisso: você não tem que ser de ninguém, bonito isso. Mas, e se alguém me quisesse? Pelo menos, não ia viver sem chinelo. Ao lembrar-se disso olhou de novo para o chão, seu pé já tava rachado, as bordas sangrando e tinha umas manchas esquisitas na pele. "Ah! Se tivesse meu chinelo. Mas não tem jeito, não! Os muleque me tira toda vez".  Só era  colocar chinelo nos pés, que os meninos corriam atrás dele; desde pequeno era assim, começou depois que Chinelo disse que não gostava de ficar descalço, pois doía o pé. Burrice. Ouvia por todo lado "O muleque gosta de chinelo, só falta agora querer ter casa" debochavam, eles. Tudo era tão ruim: ficar sem cama, coberta e comida, mas sem chinelo, ah, sem chinelo era pior! doía correr, a pista sempre tava quente...vida maldita!




O sol continuava quente e o dia tava fraco, não tinha comida em nehuma parte. "será que a tia já abriu o "Dog"? ". Chinelo ia nas beiradas, o chão tava mais quente do que pela manhã. "Que diabo!" Quando chegou no "Dog", olhou pra vê se a tia tava sozinha; era uma velhinha magra que tinha pena dele e um certo agradecimento por ele não ser maldoso com ela  (como eram  os outros meninos). Todo dia ela separava um pão pra Chinelo e o "trato" era ele não contar pra ninguém, assim, não tinha que dar para os outros. O pão era tão gostoso e o molho umedecia todas as partes (já que a tia só podia dar o pão que não foi vendido da semana). Dava uma vontade de pedir mais, mas a tia tinha sido categórica: só um. Que importa, a dor na barriga passou, oras, " Do que preciso mais?". E, se tiver sorte, arrumo até o fim da noite qualquer punhado. Antes de ir embora a tia deu uma sacola pra Chinelo. Era um chinelo velho que seu neto jogara fora. "Vai ficar só um pouco maior, Chinelo, mas cabe no pé" Quanta alegria! Depois de cinco meses, mais um chinelo! E esse era legal, tinha um monstro com espada desenhado nele. Chinelo correu com vontade, o chão nem tava mais quente. "Do que preciso mais?" ria ele, com prazer, por todo lado. Quando anoiteceu, tirou o chinelo escondido e colocou debaixo da cabeça "quero vê tirar de mim". Naquela noite, Chinelo dormiu debaixo do telhado do "Mercado Central" e ficou pensando no seu novo chinelo e rindo de felicidade; sonhou que estava correndo veloz pelas ruas, com seu chinelo, desenhado de espadas. Seu coração estava tão quente e olhava sempre para o seus pés. Lembrou do que Gigante tinha lhe falado e sentia que "com meu chinelo sou livre, não sou de ninguém".




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