domingo, 27 de outubro de 2013

Opinião: Programa Mais Médicos.




 
 "O programa do Governo "Mais Médicos" visa, através da inserção de médicos nas unidades de saúde do país, fornecer melhorias no sistema de saúde que, precário e inadequado, perece e desassiste à população".



O programa "Mais Médicos" implantado pelo Governo Federal, nasceu da extrema necessidade de oferecer a todas localidades da nação, acesso à tratamentos e assistência médica, a fim de assistir de forma digna e correta à população brasileira. O projeto, urgente e relevante para reverter a atual demanda de atendimento dispersada pelo país, apresentou-se como ferramenta de mudança diante a ineficácia do atual sistema de saúde que, escasso de profissionais e estrutura física, inviabiliza o ideal atendimento à nação.





O projeto, de acordo com o Governo Federal, visa fornecer aos municípios, médicos e estrutura adequada para que os profissionais de saúde exerçam com qualidade, técnica, precisão e conhecimento as atividades denominadas "atendimento em saúde". Ou seja, fala-se aqui, não só de médicos, mas de inserir nos sistemas de saúde profissionais de diferentes formações como, farmacêuticos, enfermeiros, fisioterapeutas, etc. Fala-se, também, na criação de estrutura física como laboratórios, áreas cirúrgicas, farmácias e medicações em quantidade e variedade para atender diferentes diagnósticos; fala-se em amplo atendimento no âmbito da saúde.




Ante exposto, o programa "Mais Médicos" é um programa relevante, necessário, inteligente e social, visto que oferecerá dignidade de vida humana, como determina à Constituição, aos cidadãos. Ocorre que este projeto, no papel, apresenta-se belo e social, na realidade, com inúmeras dificuldades para sua esperada efetivação. O Governo, a princípio, formulou o programa com a inserção de médicos, acompanhada de infraestrutura adequada para viabilizar nos municípios, hospitais e unidades de saúde com estrutura viável nos atendimentos de urgência, emergência, acompanhamento, promoção de saúde e tratamento, mas, apesar de alguns profissionais já terem sido inseridos em regiões precárias e carentes, a infraestrutura física nas unidades de saúde não estão sendo construídas, a fim de receber os profissionais já encaminhados para alguns municípios.





Os médicos, estão sendo contratados, mas se ausente continuar a estrutura adequada para que todo tratamento iniciado após a prescrição possa ocorrer, o país terá mais médicos, mas não absoluta solução. O profissional médico, extremamente importante, estará na unidade de saúde para prescrever o tratamento adequado ao cidadão, mas haverá, também, a medicação prescrita para o diagnóstico? Terá centros cirúrgicos para doenças que exigem intervenção cirúrgica? Haverá a disponibilidade de centros laboratoriais e profissionais competentes para realização e emissão de exames que auxiliam o diagnóstico e o prognóstico de doenças?


"Em grande parte do país, a realidade de atendimento no âmbito da saúde é extremamente precária. Faltam médicos, infraestrutura e qualidade. E o Estado, negligente e corrupto, não efetiva meios para sanar a problemática".



Se o programa se restringir no contrato de mais médicos e não for acompanhado de uma mudança significativa em todo sistema de saúde, o problema não se solucionará, apenas o Governo estará aplicando uma alternativa paliativa (ineficaz, no caso) para mostrar à população que possivelmente o atendimento em saúde, tão solicitado e exigido como a Educação, será melhorado, mas nos hospitais só teremos mais médicos que, identificando as nossas necessidades orgânicas, não poderão fazer mais do que prescrever o tratamento e desculparem-se, visto que o Governo os contratou, mas não criou meios para eles efetivarem o que estudaram para fazer. Descaso com o povo, descaso com o sistema e descaso com esses profissionais que não poderão realizar com totalidade o ofício da medicina.





Além de tais questionamentos citados, o programa "Mais Médicos" suscitou no Brasil, entre a população e os profissionais da medicina, discussão sobre a efetivação do programa visto que, prioritariamente, médicos brasileiros seriam contratados para o programa e na ausência de inscritos, vagas para médicos estrangeiros seriam disponibilizadas. A formação acadêmica dos profissionais, principalmente cubanos, foi questionada, visto que a categoria de médicos do Brasil consideram a formação intelectual daqueles, inadequada à realidade brasileira. Em contraponto, os médicos brasileiros não aceitam trabalhar em regiões precárias e por uma remuneração que consideram inferior ao nível de conhecimento que definem ter.




O número de médicos brasileiros inscritos no programa foi inferior ao desejado, de forma que médicos estrangeiros, como esperado, foram contratados para regiões brasileiras esquecidas, carentes, que médicos brasileiros consideram precárias, saturadas de problemas e com remuneração e estrutura inviáveis para exercerem a profissão, visto que nos grandes centros e metrópoles, trabalham por boa remuneração, qualidade de vida e acesso. O fato é que a maioria da categoria não aceitou participar do programa, mas não aceitam, também, que médicos estrangeiros exerçam a medicina no país. Quem perde, o médico brasileiro? O médico estrangeiro? Não. Nenhum dos dois. Quem perde é a população que quer saúde, quer ser atendida e necessita de auxílio, de forma que a inserção de mais médicos, mesmo não sendo brasileiros, foi positiva ao sistema de saúde do país, mas, claro, deve ser acompanhada de uma mudança na infraestrutura e atendimento geral no sistema de saúde.





O fato, também, é que os médicos estrangeiros aceitaram trabalhar por uma remuneração considerada inaceitável pelos médicos brasileiros e tornaram-se mão de obra barata para o Governo, que estão aproveitando da necessidade desses estrangeiros para gastarem pouco e, ainda, afirmarem que estão fornecendo saúde completa e precisa. Os cubanos, por exemplo, ganham pouquíssimo, trabalham muito e grande parte de sua remuneração é mais para seu país, Cuba, do que para eles mesmos. Estão trabalhando mais pela esperança deste dinheiro ser aplicado em Cuba, para melhoria de toda nação, do que imbuídos pela necessidade de "fazer riqueza" que, aqui, não vão fazer. Devemos ter mais respeito por estes profissionais e não desprezo, não agressividade, como tem sido publicada pelas mídias na recepção deles; e os médicos brasileiros deveriam ter mais educação e consciência de que se não acham viável trabalharem pelo que consideram "pouco", não devem impedir milhões de brasileiros de serem assistidos. Como profissionais que formaram-se para curar e auxiliar, devem colocar, como no velho juramento do grande Hipócrates, o ser humano como prioridade. Conscientes que estes brasileiros devem ser assistidos, seja pelo profissional de qual língua for. Devem ser tratados, respeitados, terem, afinal, dignidade de vida humana.




Que o preciso programa "Mais Médicos" não se restrinja em seu título, tornando-se isso mesmo, apenas mais médicos contratados pelo país, mas seja um projeto visionário que contrate bons profissionais para trabalharem num sistema de saúde equipado e preparado para atender e tratar à população. É necessário mais médicos, mas é primordial infraestrutura para esses médicos, estrangeiros ou brasileiros, trabalharem, a fim de que realizem com amplitude suas funções, afinal, o que adianta prescritores, sem as ferramentas para aplicar os tratamentos? A mudança deve ser global, aniquilando a falta de assistência do Governo, ampliando e trabalhando para melhor formação dos profissionais de saúde e modificando a tramitação do profissional médico, para ele ser mais nômade, levando seu trabalho e conhecimento para todas as localidades e não só para grandes centros e elite, transformando o programa "Mais Médicos" no que deve realmente ser: "Mais Saúde".








quarta-feira, 19 de junho de 2013

Manifestações Contra a Copa: A Coerência da Reforma Social Mediante Métodos Irascíveis.





  " Imagens de manifestantes, por todo país, reivindicando o absurdo dos investimentos revertidos à copa, em detrimento de necessárias melhorias em diversos setores sociais".
                                    



O investimento excedente e inapropriado que o Brasil utilizou para a realização da "Copa das Confederações" e posterior "Copa do Mundo" suscitou no povo, em sua maioria, revolta e indignação diante projeto que encaminhou soma considerável do dinheiro público para uma empreitada que não oferece ou condiciona nenhum tipo de melhoria para a saúde, educação, segurança pública e todos os demais setores da sociedade, essenciais para a regulação e mantimento da dignidade de vida humana. O povo, movido por profunda indignação, decidiu usar sua voz, opinião e força para mostrar para a gestão atual que não compactuam com a ideia de transferir nossos impostos, frutos de muito trabalho, para um evento que de nada adiantará para formação de uma sociedade assistida, completa e baseada na justiça social. As constantes manifestações que estão ocorrendo por todos os espaços do Brasil foram fundamentadas na necessidade de apresentar ao governo que há brasileiros conscientes, sóbrios das nossas reais carências. Junto a indignação da realização das copas, outras reivindicações, também, foram incluídas nas manifestações, a fim de solicitar direitos em outras áreas e funções sociais.





As manifestações, de fato, surgiram com a genuína necessidade de mudança social. Surgiu com a vontade de brasileiros sensatos e racionais desmistificarem essa medíocre ideia de "País do Futebol", como se tal menção fosse enriquecer ou colocar o Brasil em patamar de superioridade ou subtrair as crises sociais que enfrentamos diariamente. Infelizmente, as manifestações, que deveriam ser sumamente baseadas em diálogos, opiniões e ordem, estão se tornando um evento de puro vandalismo, criminalidade e desgastes sociais. Como pedir paz, fazendo guerra? De que maneira o vandalismo, a destruição de imóveis, edificações e locais públicos, contribuirão para mostrar à atual gestão a nossa discordância à corrupção, aos gastos com a copa e a falta de estrutura social para sermos assistidos, auxiliados e respeitados? Não há como. O retrato, na verdade, está demonstrando um povo ainda despreparado para lutar por mudanças sociais, que está tão cansado, que utiliza-se da força física para solicitar uma forma de vida que já não suporta mais não ter: estabilidade. Nesse panorama até a classe alta, principal comparsa na desigualdade e má distribuição de renda, se mostra favorável a mudanças que, por esforço próprio, nunca fizeram. Artistas, aproveitando dos holofotes, postam em seus sites de relacionamento menções sobre a manifestação, como se estivessem contribuindo para reforma social do país, com simples postagens e dizeres. As manifestações, inicialmente politizadas e agregadoras, tornaram-se um circo de hipocrisia e alienação. 





O fato é que o principal motivo que desencadeou as manifestações foi a incoerência de um país de fragilidades sociais, carente em todos os seus setores, e necessitado de investimento e melhorias, receber um evento que causa mais prejuízos do que benefícios. O esporte, obviamente, é importante para o desenvolvimento saudável do indivíduo, mas não posso concordar que exista algum benefício social, político e educacional do esporte na vida da sociedade como um todo. A idolatração em torno do futebol, no Brasil, tornou-se um fator negativo para nossa emancipação enquanto país em desenvolvimento. Que cidadão racional poderá concordar com a renda absurda que é revestida ao futebol e a jogadores, enquanto cientistas, professores e trabalhadores de diversos setores sociais, vivem com renda precária e desprestígio social? Vivem, na verdade, motivados mais pela paixão pela ciência, pelo educar e melhorar do que visando uma estrutura de vida de qualidade material e social. O dinheiro investido para melhorar e equipar estágios, proporcionaram a amarga sensação da construção de escolas, hospitais, centros de estudos... E, ainda, os cidadãos de classe baixa, apesar de terem financiado a inútil construção desta superficialidade moderna, em sua maioria, não poderão sequer custear os ingressos para assistirem os jogos, pois o valor dos ingressos selecionaram a classe média e alta como espectadores. 





Além da incoerência do Brasil receber as copas, as mídias sociais frequentemente explanam uma preocupação leviana e vulgar: como iremos receber os estrangeiros? O Brasil está preparado para recepcionar estrangeiros, sendo este país de índio? Brasileiros de formação alienada, desvalorização social e preocupados não com os malefícios das copas, com tanto dinheiro investido na conquista de um título, mas em não "fazer feio" para estrangeiro. Um jornal de renome nacional, tem como pauta a copa e a qualidade do setor de turismo para recepcionar europeus e afins. A imprensa, que deveria informar criticamente e elucidar a situação como um todo, restringiu seu papel em mostrar as futilidades de uma elite alienada e tola, que insiste em marginalizar e segregar seres humanos. Apesar de tantos transtornos, erros, manifestações, hipocrisias e opiniões insensatas de pessoas que pouco colaboram para o desenvolvimento positivo do país, há um fator extremamente importante e positivo nesses movimentos: o desejo de reforma. Reforma social, política, educacional. Reforma do próprio método do formação individual e coletivo. O caminho, ainda, está "torto", mas não quer dizer que nós, como povo, não estamos nutrindo o principal princípio de reforma social: vontade. E é essa vontade de mudar que proporcionará novos caminhos, definições e conscientização do que seja coerente enquanto indivíduos e coletivos. Que essa vontade inicie um processo de mudança, transformando o país do futebol em um país de igualdade e justiça social. Pois este, sim, é o título que temos que carregar com orgulho e admiração.





domingo, 17 de março de 2013

O Espelho de Alice.





                                             Garota no Espelho, 1954,  
                                            Norman Rockwell.



Próximo à janela, um espelho de tamanho mediano e caracteres antigos demonstrava a imagem estranhamente nova daquele rosto que o mundo ainda definia como jovem, mas que sua dona o via impregnado de marcas, achados e experiências não vividas na prática, mas sentidas com a intensa paixão dos passionais, dos que temem os passos com medo da desilusão. Tantos dias passados, horas esperando e rostos vistos e prontamente arquivados como dias que já não fazem parte da realidade, tornando-se, em fração de segundos, em imagens para se lembrar e não esperar. Um espelho tão mediano, tão pequeno que mostrava os anos acabados, os impactos deixados e as marcas físicas do corpo da jovem Alice, que, aos poucos, dava adeus à juventude; medrosa de não tê-la vivido, amado e sentido com a plenitude de ser viva, jovem e aberta a cometer muitos erros e poucos e medíocres acertos. Seus olhos já não mais brilhavam e seu corpo se aproximava da velhice. Teve trabalho, tristeza, buscas, alegrias e dilemas sempre a lhe maltratar. Na sua pele de moça, foi reflexiva, medrosa e ansiosa pela espera do novo, diferente, do convidativo e da ideia da realização pós-juventude. A realização de ter visto, vivido e sentido de tudo um pouco, visando fornecer à sua nova jovem velhice a sensação de prazer, a fim de enganar a tristeza de que a vida passa, mas com tanta experiência adquirida, nunca será uma fonte de lamentação (não houve desperdícios).








De pés descalços, pele levemente enrugada e sonhos ainda a serem realizados, Alice, tão jovem e sentindo-se tão velha, insistia em deixar sua face naquele espelho velho, que não mentia, iludia e não amenizava novas e velhas verdades. Uma jovem tão enigmática e estranha que aos poucos fora conceituada pela sociedade como idiossincrática. A jovem velha observou, com tamanha perplexidade, que todos os sentimentos, sonhos e desejos da sua juventude foram embora, sem precisão, sem justificativa e consideração por ela, como se fossem amigos de longa data que mudaram-se para outro continente, sem ao menos deixar endereço ou qualquer localização. Mas, de todas as formas existentes de sentir, apenas uma ficou a lhe acompanhar: o medo. Medo de ter feito pouco, medo do amanhã, medo da insegurança da vida física e de sentir o amor tão próximo que a decisão de mandá-lo embora parece ser mais segura do que o medo de vê-lo partir todos os seus (ainda) poucos sonhos e ideais. Alice, perto de sua dita velhice, continuava a se olhar no espelho, questionado sua pequena vida, seus feitos e afazeres e se, dentro de tanta mediocridade, chegara perto de realizar algum projeto significativo, abraçou alguém com verdade e se teve a oportunidade de ser melhor, bondosa ou até mesmo esperançosa de dias melhores para si e para o mundo.








Mas, por mais que continuasse a se olhar e refletir o seu breve e improdutivo passado, nas reminiscências de sua alma, não conseguia visualizar nenhum dado que confirmasse suas indagações sobre seu próprio mundo interior. Seu espelho, tão encantadoramente clássico e antigo, insistia em lhe mostrar o único sentimento que governava sua vida: o medo de ter feito de sua própria vida, um grande boneco de fantoche manipulado pelo mundo, que movia-se quando os outros queriam, sentia quando era necessário e desejava tudo o que já fora planejado; não nascido de sua vontade de ser, ter e viver. Alice, perto de sua velhice, descobrira algo que poucos conseguiam entender antes de transitar por qualquer fase: que não exisitia nada novo, os conhecimentos eram sempre os mesmos, os padrões morais frutos da ignorância dos homens e que seus próprios sonhos eram produtos sociais de um sistema capitalista. Profissão, união, trabalho e todas as atividades exercidas, não passavam de tarefas impensadas, decoradas e formuladas para o funcionamento coletivo do mundo.








De todas as ilusões, nada era mais cruel e penetrante do que o fato de ser pouco no mundo. Uma protagonista sem ter participado de nenhum ato. Como era revelador aquele espelho, tão objetivo e preciso em suas verdades. Na verdade de mostrar os segredos daquela face da jovem velha Alice. Alice, tão velha sempre fora, nunca aceitara ser jovem, por isso, chegar à sua velhice não era mais novidade, mas apenas uma extensão do próprio ato de ser no mundo (a escolha que fizera desde o momento que entendeu que tinha uma vida e o que deveria fazer com ela). De tanto pensar, mal percebera que o sol já tinha se guardado para a outra parte do globo e que à noite havia chegado. Acendeu à luz, tornou-se a se olhar, questionou o mundo, tudo e cada observar. Nada lhe foi dito; somente marcas novas no rosto, seus olhos sem brilhar e um corpo que revelava que a vida passava aos poucos, mas não deixava de avisar os tempos perdidos, passados e todos os erros de uma história. Já cansada, levantou-se para outras tarefas realizar, arrumou seu espelho na parede, abriu a porta do seu quarto e, ao voltar seu rosto na esperança de alguma resposta, seu espelho refletiu sua imagem mais uma vez, deixando na jovem Alice a grande indagação de sua jovem velhice: "será que vivi tudo e certo?". Ao fechar a porta, apenas um espelho mediano de caracteres antigos iluminava o quarto.