sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Maus-tratos aos Animais e a Hipocrisia Humana.




As imagens cruéis, violentas e absolutamente revoltantes que registrou a agressão que a enfermeira Camila Côrrea cometeu contra um cachorro, foram divulgadas por todas as mídias sociais, formando opiniões drásticas e críticas pela sociedade, devido ação cruel de uma mulher que, além de cometer um ato hediondo com um ser vivo, o fez na frente de uma criança, sua filha e, como fator questionável, é enfermeira, uma profissão eminente que em nenhum momento alude a ideia de desumanidade e crueldade. As pessoas (reagindo naturalmente a um ato de natureza criminal) apregoaram à mulher, tendo acionado a justiça para que medidas cabíveis fossem aplicadas diante as circunstâncias ilegais. Apesar de inúmeras opiniões, os fatos são estes: Camila foi absolutamente errada, o exemplo para filha foi negativo e situações como essas, realmente, merecem repreensão por parte da justiça. Mas há um fator inserido neste crime que é superior a esta mulher e a sua ação hedionda: há uma excessiva hipocrisia humana. Os animais desde o início da civilização (assim como a natureza) são usados e abusados em prol do desenvolvimento da sociedade - que define o crescimento social através de seu potencial econômico. Por mais que todo sofrimento animal tenha sido moderadamente mitigado com o decorrer da evolução moral, os animais, ainda, sofrem maus-tratos e são constantemente denegridos pela nossa espécie.




Os animais nos serviram e servem das mais variadas formas, desde tempos remotos. São utilizados como alimentos, meio de locomoção, como matéria-prima para produtos diversos, para pesquisas que visam testar produtos de uso humano... Sintetizando: os animais tornaram-se escravos dos homens e, sendo formados apenas por instinto, não podem sair de tal posição. A opinião negativa a atitude de Camila é reação natural diante comportamento errôneo, mas deve ser conscientizado que todos nós, também, contribuímos para os maus-tratos realizados contra os animais diariamente. No mesmo dia da divulgação do vídeo, quantas pessoas não se alimentaram de carne? Usaram maquiagens e produtos que certamente foram testados em animais? Quantos não consomem produtos provindos de origem animal, como roupas e objetos? Quantos, ainda, não pagam espetáculos de circos que usam animais de forma indevida? Quantos não apreciam o horror da cultura do Rodeio? O próprio sistema social criou vias de aniquilar a vida de animais que podem causar malefícios aos homens e a sua saúde, criando a "Zoonose" que investiga e rastreia os animais de rua, sem dono e, ao invés de tratá-los, os matam para não "prejudicar a sociedade", com o CONSENTIMENTO de todos. O vídeo da enfermeira causou espanto pois ela fez a ação com as próprias mãos, atingindo uma crueldade não "realizada" pela população todos os dias. Ao contrário de Camila, não matamos com nossas mãos, pagamos para que outros  façam. É assim quando compramos carne e produtos a base do sofrimento animal. Todos nós somos reú nesse julgamento.




E, apesar dos inúmeros argumentos de que o cachorro é mais relevante que uma vaca e por isso a comparação seria esdrúxula, o conceito não pode ser realmente visto com seriedade. Em países ocidentais é natural comer carne bovina, mas não a de cachorro. Nossa cultura caracterizou o cachorro como "amigo do homem", separou animais para serem domesticados para consumo e serem domesticados para servirem a humanidade. Na India, uma vaca é sagrada, logo, seu consumo é um pecado. Há países que não definem o cachorro como animal doméstico, mas como comida. O fato é que todos  animais  deveriam ser respeitados, mas TODOS nós não respeitamos, de diversas maneiras. O fato de acharmos que o comportamente da agressora está distante do que nós mesmos fazemos todos os dias com os animais é uma tremenda hipocrisia humana. Nós, também, agredimos os animais. Talvez, não espancando até a morte, mas pagando pelo seu sofrimento e ainda pensando que nossa conduta está sendo mais ética do que a dessa senhora. Não estou defendendo a postura maldosa dessa senhora, mas querendo ampliar um olhar que adquirimos de que maus-tratos a animais se restringem em matá-los com as "proprias mãos" sendo que pagamos para assassiná-los diariamente. Se o mesmo é para ser morto ou somente membro de um núcleo familiar, será relativo a cultura do local, de forma que a espécie tem suas peculiaridades dependendo de como a região a trata; o aspecto não é humanístico, mas sim cultural. Fato este que faz com que o Brasil não mate e não aceite a morte de cachorros para consumo, mas faça uso de carne bovina, ao contrário de países que comem carne de cachorro e não bovina.




A humanidade deve compreender suas ações de forma abrangente para desmascarar nossas facetas incongruentes, mas que guardamos dentro de nós como sinônimo de normalidade; de necessidade. Os animais fazem parte da natureza, assim como nós, e todos precisamos dos recursos ambientais para viver e sobreviver. Julgar (fora de uma jurisdição) essa mulher e sua família querendo agredi-la é equiparar-se com o próprio comportamento realizado pela mesma, invertendo apenas o papel do agressor e vítima. Os animais devem ser respeitados e não nasceram para servir o homem (como o mesmo imagina). Que deixemos nossa excedente hipocrisia de lado, ou melhor, que seja excluída de nossa pequena visão e possamos ver com totalidade que também contribuímos diariamente para a morte, maus-tratos e degradação da vida animal. Direta ou indiretamente somos responsáveis por este absurdo humano.




Eis, aqui, uma pessoa que orgulha de ser vegetarina, mas é consciente de que ainda precisa aprender (e mudar) muito para alcançar o verdadeiro respeito aos animais.





sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Meu Eu. Eu Meu.




Tem um mundo dentro de mim. Um mundo que não conheço, que busco encontrar, mas que a mim se fecha, toda vez que tento entrar. Um mundo estranho, sem definições ou sonhos. Que vive, às vezes vegeta, mas existe. Sem demarcações, ilusões ou mapas orientadores. Não sei bem o que quer ou o que sente. Mundo vasto, de histórias grandes e tensões constantes. Fala, mundo! Fala de forma inteligível, não se vigie para o infinito e se guarde para o abstrato. Floresça na primavera, se desfolhe no outono, se guarde no inverno, mas sinta todo o calor da sabedoria.



Não se aprisione em moradas temporárias, em dias não vividos pela decepção do enfrentar. Nasça artista, crie o impossível, questione o diário e experimente o pensar. Sem delongas, nem mágoas, faça crescer a felicidade do encontrar, do indagar, do querer e do riso bonito, exteriorizado pela mais genuina vontade do gostar. Gostar do que fazer, do que falar, questionar, gostar, sobretudo, do que se é. Eu sou. Eu estou. Eu, único, exato, incomparável, insubstituível. O eu sempre. O eu  individual, não o eu egoísta. O eu amar, amar singular, primeira pessoa. O eu (constantemente) se olhar, melhorar, volitar. O eu que preciso encontrar nesse mundo fechado, que não aceita me orientar.



Egoísmo - ou não - só desejo esse eu. Esse eu meu pra poder caminhar. Sem meu eu, não tenho tu, nem eles, nem vós. Não posso ser plural; não posso me juntar, pois como saber qual minha parte, se não sei minha composição. Eita, eu difícil, teimoso, danado. Se afoga sem pedir ajuda, fica nas margens sem andar. Eu, quero te amar. Eu meu, meu sempre, que só preciso encontrar, amar, sonhar e despertar do mundo fechado para o mundo aberto do transformar. Um mundo de infinito pensar e iluminar. Meu eu, eu meu.




sábado, 3 de dezembro de 2011

O Velho e o Mar.



O velho gostava daquele mar incógnito, distante e raivoso. Olhava para longe e esperava algo acontecer, como se toda aquela quantidade infinita de água guardasse um segredo ou felicidade a ser desvendada. O velho era do mar e ele acreditava fielmente que o mar era dele. Mais que isso, que o mar fora feito para sua contemplação religiosamente diária. Acordava cedo, buscava localização segura para higienizar-se e tomava um punhado de café preto, quente e amargo. Amargo como a vida que levava sem seu mar. Quando o escuro se despedia e o sol alcançava a costa, via seu barco nas margens; um barco velho e gastado por um tempo incalculável de jornadas que traçava em suas tempestades em busca de seu "peixe grande". Criava metas, sonhava com o impossível e podia, muitas vezes, se ver atravessando na extensa faixa de areia arrastando um ser grande, natante, que demonstrava ser um lutador nato, que brigara com ele para não sair do seu lugar, do seu divino mar. Sonhos distantes em que via (cheio de ego) toda comunidade da costa lhe cumprimentar e parabenizar por um feito comum, mas que para ele representava o mais doce sonho vivido: o sonho de sua existência.





Era um velho estranho, esquelético e sagaz, com proporções corpóreas disformes e um único amigo na vida: aquele menino pequeno, bondoso, que lhe guardada comida e uma profunda amizade. Um menino que era do mar e que a ele servia, para ser sempre servido. Ambos se uniam com a mesma força, o mesmo gosto e a mesma paixão: o mar. Seu mar. Um mar que ofertava belezas diversas, tempestades constantes e alimentos abundantes para uma população corriqueira, sem metas e medidas, mas atuantes em suas necessidades e buscas, não esquecendo nunca de cada tarefa a realizar, como pescar e preparar sua ceia. O velho era formado por sua aldeia, seu povo, seu menino e seu mar. Queria ter um único feito na vida: pescar seu peixe grande e, depois, nem sabia mais o que desejar, o que poderia mais querer dessa vida curta, em que o disfarce do amor é vendido, a felicidade comprada e as ideias já formadas e enquadradas sem o homem pensar.




Era um velho saudoso de suas águas, sonhador convicto e amigo de seu amigo, o menino mais bondoso das historietas sobre um homem e um sonho. Um velho que partiu para longe da costa, encontrou seu sonho da forma mais viva que alguém poderia achar e lutou por ele como um guerreiro forte - embora todas as condições fossem contrárias. Um velho que retornou mais magro, com seu barco ainda mais "capengado" e com seu ideal puxado pelas costas. Arrastando seu peixe como trofeu e finalizando uma narrativa bonita não por sua complexidade, mas por apresentar da forma mais simples possível um velho, um sonho e um surpreendente mar.



Minha homenagem a obra mais encantadoramente simples e genuina (por isso rica e complexa) que a literatura norte-americana escreveu "O Velho e o Mar" de Ernest Hemingway. Um velho, o mar e, principalmente, um sonho.